terça-feira, 22 de setembro de 2015

Lindenbaum

I

Te encontro em uma bifurcação de estradas. Nas suas costas, um paredão de montanhas com curvas atraentes. Aquele frio que só a região andina permite: congela mãos e orelhas, te faz sentir mais vivo. Caminhamos por um caminho estreito, ora eu atrás de você, ora você atrás de mim. Poucas vezes caminhamos juntos, minha mirada em direção ao chão. Conversamos trivialidades, ainda que ambos sabemos que uma análise intensa de nossas personalidades está em jogo. Na verdade queria te perguntar: O que te faz sentir vivo? Você também vive todos os dias se distraindo de inseguranças e evitando momentos importantes? O que é coragem pra você? Será que eu sou agradável pra você como você é para mim?
Nosso encontro acaba antes do que eu esperava e me custa entender o que aconteceu. Ao mesmo tempo, me sinto livre de pressões e isso te torna encantador. Quanto disso é você, quanto disso sou eu?

II

Vou ao cinema sozinha. Ignorei sua existência por vários dias, e entre 600 poltronas, você se senta justamente atrás de mim. Claro que tinha te visto entrar, mas fiz que não. Ironias da vida. Você até decide me cumprimentar. Te convido para uma cerveja? Melhor outro dia. Desculpa, não quero que carregues o peso das minhas expectativas.

III

Festa, fumaça, batuques. Essa banda que mistura Tame Impala com Devendra Banhart. Gosto. Mas já não tenho tanto saco para gritar quando quero conversar. Também não quero parecer ser o que não sou. Não sei dançar, por que não vamos para um lugar onde podemos falar de assuntos metafísicos? O show está bom, mas não estou interessada no show agora. Quantos litros de cerveja para... obrigada por elogiar meu cabelo, ainda que soe mecânico. Entendi a mensagem de que eu te agrado.

Me apaixono no momento que me encontro com a sua estante de livros. É um ato erótico passar os dedos pelos seus títulos. Uau, você ainda tem CDs.
Você tocando teclado nas minhas coxas. Quanta doçura na luz que atravessa suas cortinas Made in Finland e cai direto nas suas costas nuas. Quero te abraçar pelas próximas quarenta horas. Uma pena que seja domingo e você está ocupado com o mundo e não comigo.

IV

Gosto de te ver dançando aí em cima, um impulso que te sai de um momento para outro. Devo te contar que apesar da distância consigo perceber que você está me olhando. Que flerte timidamente deleitoso. Estou quase implorando para que deixes um pouco de espaço para eu me despir completamente.
Um chá verde. Um programa de rádio. Seu senso de humor irônico me causa prazer, também. Será que é por que acabo de te conhecer? Será que, se fossemos obrigados a conviver em outras condições, gostaria tanto do seu silêncio? Posso te escrever uma carta contando como esses dias que passo com você me fazem bem?
Meu deus, seus braços sob meu corpo. A voz do Sufjan Steven completa esse buraco gigante que é meu peito e sinto meu corpo vibrando. Suas paredes me engolem. Tenho que me despedir mas já quero voltar.

V

Eu dividiria minha solidão todos os dias com alguém que me faz massa caseira com cogumelos. Fio por fio, cogumelos cuidadosamente cortados pela faca afiada. Esse vinho me faz querer grudar no seu corpo e te afogar de mim. Agora eu vou te perguntar: vai sentir minha falta quando eu for embora? Esses dias curtos foram maravilhosos para você como foram para mim? Qual caminho eu tomo pra te atingir direto por dentro? Você aceita me amar eternamente nas minhas condições itinerantes? Não, vamos ver esse desenho animado freak e aproveitar esse último momento dissimulando que não estou fervendo por todos os poros.
Odeio seu despertador. O Murakami não me respondeu. Algumas horas atrás, você deitou sob meu peito e tive a impressão de que tentava escutar meu coração. Será que você busca as mesmas respostas que eu? Estamos mesmo tão conectados ou é coisa de momento? Esse instante é tudo que temos. Eu escreveria em vermelho nas suas paredes que sou capaz de te amar até o último dia da minha vida. Lide com essa intensidade que você provocou.

VI

Tudo termina com uma despedida frouxa e um riso nervoso da sua parte. Minha imaginação corre ridiculamente pelos filmes do James Cameron onde um impulso de coragem resgata uma idéia já fadada ao fracasso. Mas esse encontro tá muito mais para filme do Angelopoulos do que eu posso controlar. Deixemos tudo para depois, talvez em alguma realidade paralela eu posso acordar todos os dias com seus cabelos ruivos preenchendo a minha primeira visão do dia. Talvez essa incerteza é o que te torna tão irresistível.
   

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